Gabriel Bigaiski
9 de maio de 2025
Hora Extra na Troca de Uniforme – Ainda Tenho Direito?

Você chega ao trabalho, vai até o vestiário, coloca o uniforme, bate o ponto e começa o expediente. No fim do dia, bate o ponto, vai trocar de roupa e só então vai embora. Esse ritual parece comum para muitos trabalhadores, mas esconde uma dúvida muito importante: hora extra na troca de uniforme, ainda tenho esse direito?
A pergunta faz ainda mais sentido depois da reforma trabalhista de 2017, que trouxe mudanças importantes na CLT sobre o tema.
Neste artigo, vamos explicar:
O que é hora extra;
O que mudou com a reforma;
E quando a troca de uniforme ainda pode gerar o direito ao pagamento de horas extras.
Sumário
1. O que é hora extra?
Hora extra é todo o tempo de trabalho que ultrapassa a jornada contratual legal ou combinada entre empresa e trabalhador.
A regra geral da CLT é clara:
A jornada normal é de até 8 horas por dia e 44 horas por semana.
Se o trabalhador ultrapassa esse limite, tem direito a hora extra, que deve ser paga com acréscimo de pelo menos 50% sobre o valor da hora normal.
Além disso, o artigo 4º da CLT determina que também é considerado tempo de trabalho aquele em que o trabalhador esteja à disposição do empregador, ainda que não esteja realizando suas funções diretamente.
E aí que entra a discussão sobre a troca de uniforme: será que o tempo gasto colocando ou tirando o uniforme é tempo que o trabalhador está à disposição da empresa?
2. O que mudou com a Reforma Trabalhista?
Antes da reforma da CLT (Lei nº 13.467/2017), a troca de uniforme era frequentemente reconhecida como parte da jornada de trabalho quando fosse obrigatória e feita nas dependências da empresa.
Ou seja, se o trabalhador era obrigado a se trocar no vestiário da empresa antes de bater o ponto, aquele tempo era contado como tempo à disposição, e poderia gerar pagamento de hora extra.
Acontece que, com a reforma, foi incluído o §2º no artigo 4º da CLT, com a seguinte redação:
§ 2o Por não se considerar tempo à disposição do empregador, não será computado como período extraordinário o que exceder a jornada normal, ainda que ultrapasse o limite de cinco minutos previsto no § 1o do art. 58 desta Consolidação, quando o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares, entre outras.
Ou seja, a troca de uniforme passou a não ser considerada tempo de trabalho, salvo se a troca for obrigatória.
Isso fez com que muitas empresas deixassem de pagar hora extra por esse período, alegando que a lei mudou. E de fato, mudou.
Mas atenção: isso não significa que o trabalhador perdeu todos os seus direitos. Existem exceções importantes que ainda garantem o pagamento da hora extra em casos de troca de uniforme. Vamos explicar.
3. Quando a troca de uniforme pode gerar direito a hora extra?
Apesar da nova redação da CLT, a Justiça do Trabalho tem reconhecido o direito a hora extra em algumas situações específicas, principalmente quando a troca de uniforme é obrigatória e o uniforme precisa ser colocado ou retirado dentro da empresa.
Veja quando a hora extra ainda pode ser devida:
✅ Troca obrigatória e controlada pela empresa
Se o uso do uniforme é obrigatório e o empregador exige que ele seja vestido nas dependências da empresa, isso caracteriza tempo à disposição, pois o trabalhador não tem opção de se trocar em casa.
Exemplos:
Empresas que proíbem a entrada e saída com o uniforme;
Locais com vestiário obrigatório antes de entrar no setor de trabalho;
Uniformes que exigem procedimentos de segurança ou higiene para serem colocados (ex: EPIs complexos, roupas esterilizadas etc.).
Nesses casos, o tempo gasto com a troca pode sim ser considerado como parte da jornada de trabalho, mesmo após a reforma.
⚠️ Uniforme que só pode ser usado no local de trabalho
Se a empresa proíbe o uso do uniforme fora das dependências da empresa por razões de segurança, imagem, higiene ou qualquer outro motivo, isso reforça a obrigatoriedade da troca no local.
Isso tira do trabalhador o poder de escolha e o coloca à disposição da empresa antes e depois do expediente — o que, pela lógica da própria CLT, pode caracterizar tempo de serviço.
⚠️ Vestiário com controle de entrada e saída
Há empresas que possuem controle de horário para entrada no vestiário e até exigem que o trabalhador já esteja uniformizado antes de bater o ponto.
Ou seja: o trabalhador é obrigado a estar pronto antes de iniciar o registro da jornada — o que claramente impõe uma obrigação fora do controle do ponto.
Isso também pode caracterizar o direito à hora extra pelos minutos gastos na preparação.

4. E quando a troca de uniforme não gera hora extra?
Por outro lado, existem situações em que a troca de uniforme não gera direito a horas extras. Isso acontece, por exemplo, quando:
O uso do uniforme não é obrigatório;
O trabalhador pode se trocar em casa, sem nenhuma restrição;
A empresa não controla o horário da troca, nem exige que o uniforme seja colocado nas suas dependências.
Nesse caso, o tempo gasto com a troca de roupa é considerado algo pessoal, fora do controle da empresa, e portanto não entra na contagem da jornada de trabalho.
5. O que dizem os tribunais?
Apesar da mudança na CLT, a jurisprudência continua reconhecendo o direito à hora extra em casos onde há obrigatoriedade e controle por parte da empresa.
Diversos tribunais têm decidido que:
Quando o trabalhador é obrigado a colocar o uniforme na empresa, e não pode fazê-lo em casa;
E quando há fiscalização ou restrição ao uso do uniforme fora do ambiente de trabalho;
O tempo gasto com essa troca deve ser remunerado como parte da jornada, ou como hora extra, se ultrapassar os limites legais.
Ou seja, a reforma não eliminou completamente o direito, apenas criou um critério mais rígido — e quem estiver dentro desses critérios, ainda pode buscar seus direitos.
6. Como comprovar que tenho direito a hora extra pela troca de uniforme?
Se você quer saber se tem direito e pensa em entrar com um processo, alguns pontos são fundamentais:
Provar que a empresa exigia a troca no local (com testemunhas, e-mails, normas internas, vídeos etc.);
Mostrar que havia controle de horário ou proibição de sair com o uniforme na rua;
Demonstrar que isso acontecia todos os dias, e que esse tempo era anterior ou posterior ao registro no ponto;
Levar testemunhas que também passavam pela mesma situação.
Com esses elementos, a Justiça pode reconhecer o tempo como de trabalho e condenar a empresa ao pagamento de horas extras retroativas — inclusive com reflexos em férias, 13º, FGTS, aviso prévio e outras verbas.
7. Exemplo prático para entender melhor
O Ricardo trabalhava em um frigorífico e era obrigado a colocar seu uniforme completo dentro do vestiário da empresa antes de bater o ponto. A empresa proibia os funcionários de sair uniformizados, por questões sanitárias. Ele gastava cerca de 10 minutos todos os dias para se trocar antes e depois da jornada.
Depois de sair do emprego, Ricardo procurou um advogado e entrou com uma ação pedindo o pagamento dessas horas. No processo, testemunhas confirmaram que a troca era obrigatória e fora do controle do ponto.
O juiz entendeu que Ricardo estava à disposição da empresa e condenou o empregador a pagar:
As horas extras diárias pela troca de uniforme;
Reflexos em férias, 13º, FGTS e multa do artigo 477 da CLT.
Esse tipo de caso é comum, principalmente em empresas com normas rígidas de higiene, segurança ou padronização visual.
8. Conclusão: Tenho direito a hora extra pela troca de uniforme?
Depende. A troca de uniforme só dá direito a hora extra quando for obrigatória, controlada pela empresa e realizada dentro do ambiente de trabalho, antes ou depois da marcação do ponto.
Mesmo com a mudança da CLT, a Justiça continua reconhecendo esse direito em situações específicas — especialmente quando o trabalhador não tem escolha sobre onde se trocar, e fica à disposição da empresa antes de começar o expediente.
Se você se troca todos os dias dentro da empresa, por exigência dela, e só depois bate o ponto, é bem possível que tenha valores a receber.
Fale com nossa equipe, envie seus relatos e documentos, e vamos analisar se você tem direito a horas extras por esse tempo “escondido” do seu contrato.
Caso tenha passado por alguma dessas situações e precise de orientação jurídica sobre como buscar seus direitos, entre em contato com nossa equipe. Podemos analisar seu caso e indicar as melhores medidas a serem adotadas.

Advogado Trabalhista natural de Curitiba, atua somente na defesa dos trabalhadores, graduado pela Faculdade de Educação Superior do Paraná, inscrito na Ordem dos Advogados do Paraná sob o número 98.914.