Motoristas do Uber e o vínculo de emprego – A questão do século

Atualizado em 13 de novembro de 2024 por Gabriela Bakaus

Pode parecer exagero, mas a discussão motoristas do Uber e vínculo de emprego nos moldes da CLT, é sim a questão do século no direito do trabalho.

Primeiro, porque milhares de motoristas trabalham para a Uber, sendo hoje uma grande força de trabalho.

Segundo, porque não se trata apenas do Uber, e sim de todos os trabalhadores que estão nessa mesma condição, entregadores do Ifood, mercadolíder, 99, trabalhadores que se relacionam por aplicativo.

Essa nova forma de contratação até já ganhou apelido, é a uberização do trabalho, que é caracterizada pela “liberdade”, “autonomia” e talvez precariedade nos direitos.

A questão veio à tona quando a recente decisão da 3ª turma do Tribunal Superior do Trabalho, que reconheceu o direito para um trabalhador de carteira assinada como motorista do Uber.

Já adiantamos, essa decisão vai ser recorrida, e ele vale apenas para aquele caso, mas é um importante passo, para quem sabe os motoristas do Uber e vínculo de emprego.

Vínculo de emprego – Como é caracterizado?

Antes de falarmos do vínculo de emprego dos motoristas do Uber, é importante explicar quando o vínculo de emprego existe.

Nós temos um artigo completo sobre o tema aqui, onde inclusive temos vários exemplos.

Mas, de maneira resumida, vamos elencar aqui os 4 requisitos necessários para ser configurado o vínculo de emprego:

         • Pessoalidade – o trabalho desempenhado precisa ser cumprido por uma determinada pessoa, um trabalhador específico que é contratado e ele que deve comparecer para o trabalho.

Ao contrário da terceirização, você contrata um serviço a ser realizado, limpeza por exemplo, e não uma pessoa específica.

         • Onerosidade – A pessoa que prestar o trabalho precisa receber por ele, ou seja, trabalho voluntário não é caracterizado.

         • Habitualidade – O trabalho precisa ser não eventual, precisa haver uma expectativa de que o trabalhador irá retornar para a empresa. Por exemplo, um garçom que somente vai 1 vez por semana quando o movimento aumenta, não cumpre esse requisito.

         • Subordinação – Um dos mais complexos, o trabalhador precisa estar sob comando da empresa, seguir ordens, regras, levar punições, possuir uma autoridade sobre ele.

De forma resumida, esses são os 4 requisitos do vínculo de emprego, e é no último que mora a discussão do Motoristas do Uber e vínculo de emprego.

Os motoristas são ou não subordinados à Uber?

Motoristas do Uber e vínculo de emprego – É CLT ou não?

Essa questão é realmente complexa e vem levantando vários debates na justiça do trabalho há algum tempo.

Na grande maioria das decisões, foi negado o vínculo de emprego entre os motoristas e a Uber, sob a alegação de que eles não são subordinados.

Os argumentos são:

         • O motorista é livre para trabalhar os dias que quiser, fazer os horários que quiser, bem como escolher os clientes.

         • O motorista não possui autoridade sobre ele, não possui chefe, nem recebe ordens.

         • Inexistência de metas ou cobranças por parte da Uber, sendo o motorista livre para trabalhar e ganhar o quanto ele quiser.

         • Ausente essa forma de subordinação é considerado que os motoristas são livres e autônomos no seu trabalho, não havendo nenhuma forma de subordinação.

Temos tanto decisões nesse sentido do Tribunal Regional do Trabalho, como do Superior Tribunal do Trabalho.

Contabiliza-se que já são mais de 1450 decisões em todo o Brasil negando o vínculo de emprego entre os motoristas e a Uber.

Tais decisões se baseiam totalmente na liberdade do motorista, mas será que de fato há tanta liberdade assim?

Em março de 2021, o Tribunal Superior do Reino Unido decidiu que os motoristas do Uber devem sim ser registrados e que não são trabalhadores autônomos.

Tal decisão foi inédita no mundo, decidindo que apesar dos trabalhadores terem sim certas escolhas, eles não possuem total autonomia e liberdade.

E como dissemos, recentemente uma das turmas do Tribunal Superior do Trabalho, julgou que o trabalhador tem sim vínculo de emprego com a Uber.

É importante destacar que o TST possui várias turmas, e que essa decisão vale apenas para o caso concreto e não para todos os motoristas.

Os argumentos para essa decisão foram os seguintes:

         • Controle por algoritmo – A Uber é uma empresa que de fato não controla seus funcionários diretamente, mas indiretamente, através do seu algoritmo.

Esse algoritmo é o programa de dados que acompanha o trabalhador, quantas horas ele trabalha, quais as notas que ele leva, quantas corridas ele cancela.

Ele observa e julga todos os atos do trabalhador, e inclusive penaliza ele por falhas que possa ter cometido.

Apesar de não ser um controle direito, a Uber tem total controle sobre a rotina do trabalhador, beneficiando aqueles que atendem mais seus interesses.

         • Punições – A Uber pode punir seus motoristas, e não falo apenas de suspensões, mas através de seu algoritmo ela pode diminuir a nota do motorista, jogando-o corridas piores e de menor valor.

E tais punições nem sempre são verificadas, caso um cliente deixe um comentário negativo, o motorista já será punido, sem qualquer tipo de direito a resposta.

Esse poder de punição pode ser muito enquadrado na questão da subordinação, ora se a empresa pode punir o trabalhador, ele não está sob o comando dela?

         • Jornada – De fato o trabalhador pode desligar o aplicativo quando ele quiser, mas caso ele queira receber uma renda mínima, terá que trabalhar um mínimo de horas.

Além disso, muitos trabalhadores têm liberdade na escolha do seu horário de trabalho, trabalhadores em home office, cargos de confiança, vendedores e outros.

E todos eles possuem direito a carteira assinada, o simples fato deles não terem uma jornada fixa, não implica automaticamente que eles não devem ter carteira assinada.

Esses são os principais argumentos favoráveis a reconhecer o vínculo de emprego entre os motoristas e o Uber.

Motoristas do Uber e vínculo de emprego – Nossa opinião

Como esse tema está controvertido e existem decisões tanto favoráveis quanto contra, achamos válido oferecer nossa opinião jurídica sobre o caso.

E nós acreditamos que há sim vínculo de emprego entre os motoristas e o Uber, é de fato uma nova relação de trabalho, muito mais complexa que qualquer outra que já vimos.

Mas os requisitos estão lá, estamos vendo uma geração de motoristas fazendo escalas de 12 horas, 15 horas, sem direito a intervalo, sem direito a férias.

Esses trabalhadores precisam ficar atentos ao algoritmo, que vigia eles, que fica atento a qualquer erro que eles possam cometer e acabam sendo punidos.

Cumprir todas as exigências da Uber, referente a carro, CNH, inclusive gastar do seu próprio bolso reparos e manutenção do carro, enquanto a empresa apenas fica com o lucro.

Vejo muitos motoristas relutantes a essa opinião pelo fato de terem medo de perder seu lucro, seu salário, sua liberdade.

Mas é preciso haver uma regulação justamente para proteger esses trabalhadores, colocar limite de jornada, um salário fixo independente das corridas, reparos e manutenção do carro pela Uber.

Férias, décimo terceiro, FGTS, são direitos que estão sendo suprimidos e que não são repassados aos motoristas e sim apenas aumentam o lucro da Uber.

Mas independente disso, na visão do nosso escritório, existe de fato vínculo de emprego entre os motoristas e eles não são de fato 100% autônomos e livres.

Motoristas do Uber e vínculo de emprego – Futuro

Diante dessas decisões começou a se discutir muito como será o futuro desses trabalhadores.

Na verdade, por enquanto nada muda, até termos uma decisão definitiva, os motoristas continuarão como autônomos.

Claro, pode ser que os processos trabalhistas aumentem, mas a maioria das decisões ainda é contra o reconhecimento do vínculo.

Então eu particularmente acredito que somente veremos alguma diferença quando houver uma decisão definitiva, tal decisão recente do TST não vai ser suficiente para alterar o entendimento de todos os Tribunais.

Mas foi uma luz no fim do túnel, foi a primeira vez que o TST reconheceu o vínculo, podendo abrir novas portas para novos julgamentos.

Contudo, por hora, tudo permanece o mesmo, os motoristas sem vínculo de emprego.

Motoristas do Uber e vínculo de emprego – Final

Escrevemos esse artigo para te ajudar nessas novas decisões e entender essa discussão que é muito importante para o direito do trabalho e nossa sociedade.

Lembre-se: ela não afeta apenas os motoristas da Uber, mas também do 99, do Food, e todos esses trabalhadores de aplicativo.

Por isso essa discussão é muito importante para ouvirmos os trabalhadores, ouvir suas opiniões, entender suas rotinas, eles são os que mais sentirão as alterações e devem ser ouvidos.

Esperamos que tenha gostado do artigo sobre Motoristas do Uber e vínculo de emprego, e caso tenha ficado alguma dúvida ainda, não deixe de entrar em contato com nosso advogado para conversar.

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